Como o OnlyFans atrai de ex-BBBs a Anitta e dita rumos do sexo e da pornografia

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Num passado não tão distante, quando um participante era eliminado do Big Brother Brasil, havia certo alvoroço em torno dele, especialmente se o brother era sarado ou se a sister tinha curvas voluptuosas. Com frequência, eles saíam da casa diretamente para as páginas de revistas como a Playboy e a G Magazine, onde rompiam a última barreira da exposição e mostravam a única coisa que as câmeras da Globo não captavam.

Foi o caso de Rogério Dragone, “o mais big do Big Brother”, e de Sabrina Sato, que rendeu “muito mais do que aquela espiada básica”, conforme diziam as capas de seus ensaios. Era uma forma de dar sobrevida à fama e fazer dinheiro. Antes de emplacarem carreiras como atriz e apresentadora, Grazi Massafera e Íris Stefanelli, por exemplo, teriam embolsado R$ 700 mil para mostrar tudo na Playboy.

Nas primeiras semanas da atual edição do BBB, no entanto, Key Alves deixou claro que as revistas de nudez são coisa do passado. As subcelebridades descobriram agora que podem lucrar com a própria imagem sem depender de contratos e de forma recorrente.

“Entrei no OnlyFans”, disse a atleta numa conversa à beira da piscina, enquanto falava sobre suas fontes de renda, antes de incentivar Gabriel Tavares, recém-eliminado, a fazer o mesmo. A partir daí, o Google registrou um pico de buscas pelo termo, associado a perguntas do tipo “como fazer um OnlyFans para ganhar dinheiro?” e “como baixar o OnlyFans?”.

Apesar dos mais de 2 milhões de criadores de conteúdo e dos 200 milhões de usuários que estão na plataforma, o OnlyFans ainda não é uma rede social do porte do Instagram ou do TikTok. A presença crescente de celebridades, no entanto, está trazendo cada vez mais atenção ao serviço.

Nele, criadores de conteúdo compartilham imagens, vídeos e textos com seus assinantes. Só quem paga um valor mensal pode ver o “feed” -isto é, a página de publicações. Por causa do aspecto sigiloso, o OnlyFans se tornou terreno fértil para fotos sensuais e gravações de sexo.

Anônimos, famosos e nomes que flutuam entre os dois espectros têm se voltado à plataforma em busca de uma nova fonte de renda, fama, maior proximidade com os fãs e até formas de explorar o próprio corpo ou a sexualidade. Há de tudo nos perfis, de selfies mundanas a ensaios de nu artístico, de registros da rotina a vídeos de masturbação, papai e mamãe e orgias.

Key Alves nem precisou tirar toda a roupa para fazer os R$ 100 mil que ela disse faturar por mês com a plataforma. A cantora Anitta também prefere conteúdos mais recatados, e costuma apenas rebolar e aparecer de lingerie.

Já Rita Cadillac revive, aos 68 anos, a era áurea da Playboy em ensaios de nudez explícita produzidos por fotógrafos profissionais, em que aparece com blusas transparentes repletas de pedrinhas brilhantes que envolvem seus seios fartos. Thomaz Costa, que esteve no elenco do reality show A Fazenda e da novela infantil “Carrossel”, aos 22 anos expõe o pênis flácido, ereto e até ejaculando.

Quem dita as regras é o próprio criador de conteúdo, que define o que e quando postar, bem como o valor que vai cobrar. Se está dentro da lei, está valendo. Os seguidores, se sentirem falta de algo, podem usar ainda o chat da plataforma para pedir e pagar a mais por conteúdos personalizados.

“Existem pedidos loucos. Já me pediram para pôr a ‘princesinha’ para fumar, já me pediram fotos dentro de um caixão. Tem coisas bizarras que não faço. Explico que há um limite pessoal”, diz Rita Cadillac, que tem como campeão de saída os vídeos em que, de lingerie e com cigarro na mão, fala sensualmente o nome dos fãs.

Ex-chacrete, como eram chamadas as bailarinas de Chacrinha, a dançarina e cantora criou uma conta no OnlyFans durante a pandemia, quando teve seus shows interrompidos e precisava pagar as contas. Deu tão certo que, apesar de não revelar cifras, ela afirma faturar até mais do que conseguia com as apresentações em boates pelo país.

Rita Cadillac atualiza sua página quinzenalmente, com ensaios que por vezes são temáticos e que buscam emular a extinta Playboy, com “bom gosto” e “nada barra pesada”, isto é, “nada que seja um exame ginecológico”, em suas palavras.

Ela compara a experiência à de gerir uma empresa. Em sua equipe, afinal, há fotógrafo, maquiador, figurinista, cabeleireiro e gente nos bastidores, administrando a plataforma e firmando parcerias com motéis e outros endereços e produtos que queiram aparecer em sua página.

Rita Cadillac abriu ainda uma conta no Privacy. Versão brasileira do OnlyFans adaptada para a realidade daqui, o site se mantém fiel à essência de “liberou geral” que ajudou a rede britânica de apenas seis anos a movimentar quase US$ 5 bilhões -equivalente a R$ 25,5 bilhões- em seu último ano fiscal.

A ele se junta o OnNowPlay, outro brasileiro com funcionalidades ausentes no OnlyFans, como pagamentos em boletos, Pix e cartões de débito em real. Com 85 mil criadores e 16 milhões de usuários, o Privacy oferece mensalidades que não estão sujeitas à flutuação do dólar e já está se expandindo pela América Latina.

Thomaz Costa é outro nome que experimentou tanto a versão estrangeira quanto a brasileira das plataformas. Ele chegou a receber alfinetadas públicas da própria mãe quando anunciou a entrada no OnlyFans, no ano passado.

O dinheiro foi suficiente para comprar um apartamento, mas não o segurou por muito tempo. Dizendo ter se reconciliado com Jesus, ele fechou a conta. Em menos de seis meses, no entanto, ele voltou atrás e, agora, vende conteúdo ainda mais picante no Privacy, por R$ 89,90 mensais. São registros em que balança o pênis ereto por dentro da cueca ou em que deixa a câmera deslizar pelo corpo junto aos jatos de água do chuveiro.

“Há todo um estudo feito pela minha equipe para entender o que os seguidores mais pedem, que é o conteúdo caseiro. Acaba permitindo que as pessoas criem uma fantasia na cabeça delas. Há um senso maior de intimidade”, diz o ator.

Quem o motivou a voltar à pornografia foi a namorada, a funkeira Tati Zaqui, que também produz conteúdo para o Privacy. “Aprendi a conciliar as coisas e não abandono Deus por isso”, diz ele, que deve lançar em breve um perfil de casal.

São diversos os motivos que levam alguém a expor o corpo no OnlyFans. O mais atraente é o dinheiro, principalmente para anônimos. Aos 20 anos, a ex-frentista Natasha Steffens, que está entre os criadores mais famosos da plataforma no mundo todo, afirmou em entrevistas que lucrou R$ 500 mil em dois anos anos. É como se seu salário girasse em torno de R$ 20 mil. Antes, no posto de combustível, o contra-cheque era de R$ 1.200.
É o caso ainda de Roscariano, um manauara que não revela seu verdadeiro nome. No Twitter, onde tem 517 mil seguidores, ele compartilha pílulas de seu conteúdo pornográfico, como uma maneira de anunciar e atrair mais assinantes.

Roscariano também não revela quanto fatura, mas diz que é mais do que o suficiente para se manter. Ele criou um perfil no OnlyFans assim que completou 18 anos, porque não encontrava emprego. A plataforma foi, diz ele, uma alternativa à prostituição à qual muitos jovens no seu entorno recorriam.

Conforme seus vídeos ganhavam projeção, Roscariano foi ficando mais ousado e viu suas filmagens de sexo oral e anal se converterem em dinheiro suficiente para se mudar para o Rio de Janeiro e criar o próprio negócio. Aos 21, ele é dono de uma empresa de lentes de contato -coloridas, como as que chamam a atenção nos vídeos em que seu rosto recebe esguichos de sêmen.

Lembra o discurso de muitos trabalhadores ou desempregados que migraram para serviços de entrega e transporte por aplicativo, como o iFood e o Uber. É como se a pornografia estivesse passando por uma “uberização”, com trabalhadores autônomos que enchem os bolsos de empresas com as quais não têm vínculo no papel.

Se para anônimos a plataforma pode ser o único ganha-pão, para celebridades, principalmente as de segundo escalão, representa uma oportunidade de manter a fama, cada dia mais efêmera.

O burburinho leva famosos a criarem contas no OnlyFans mesmo quando não há a intenção de compartilhar nada por lá. O cantor Silva, por exemplo, divulgou em seu Twitter um link com sua página na plataforma há dois anos, mas não voltou ao assunto. O rapper americano Chris Brown fez a mesma coisa.

Entre as subcelebridades brasileiras, o destaque vai para os ex-BBBs, como Lumena Aleluia. A baiana, que se formou psicóloga e trabalhava também como pesquisadora, roteirista e DJ antes do programa, diz que faturou R$ 100 mil apenas nos dez primeiros dias em que criou uma conta no Privacy.

Como Key Alves, Lumena não precisou tirar completamente a roupa para fazer sucesso. Ela diz, aliás, que a fama e o dinheiro ficam em segundo plano, já que a criação de conteúdo erótico representa uma maneira de enfrentar inseguranças com seu corpo e sua autoestima.

A ex-BBB afirma que sofreu críticas que abalaram sua decisão, principalmente de mulheres cujo feminismo considera a nudez, seja ela qual for, uma forma de opressão e mercantilização do corpo feminino.

“É um debate complexo. Me questionei se estava reforçando um estereótipo de hipersexualização da mulher negra. Isso me aprisionava. Eu negava minha vaidade, mas entendi que precisamos flexibilizar isso, porque não posso me furtar do meu desejo. Eu, Lumena, não posso ser responsabilizada por um problema estrutural.”

De forma semelhante, o debate em torno de corpos mais velhos se ampliou. Se as publicações eróticas antes pouco ligavam para mulheres maduras, hoje elas podem se expor à vontade.

Isadora Ribeiro é uma musa das antigas que entrou na plataforma décadas depois de marcar época exibindo o corpo bronzeado e escultural em aberturas da Globo, da novela “Tieta”, em que seus seios se mesclavam às dunas da Bahia, ao Fantástico.

Rita Cadillac diz acreditar ainda que o OnlyFans é uma alternativa também à pornografia tradicional. Ela, que diz já ter se prostituído e feito vídeos pornô para sustentar a família, lembra que os artistas pornôs, sobretudo as mulheres, são submetidos a diferentes tipos de violência.

“OnlyFans é o futuro. Conheço meninas que faziam programa e hoje não fazem mais. Elas agora não são agredidas, não correm risco de vida e de saúde e não são obrigadas a estar com uma pessoa que não é boa. Elas não estão sendo usadas”, diz.

Quem também acredita que esse tipo de plataforma é uma espécie de evolução natural da pornografia é Diego Sans, brasileiro que é um dos mais buscados do pornô gay internacional, mas decidiu criar uma página no OnlyFans, onde concentra um conteúdo mais amador.

“Essas plataformas são uma ameaça para as produtoras tradicionais, mas também acredito que elas vão se manter. Muitas, inclusive, estão adaptando seus vídeos para a demanda por pornô amador. As produtoras agora vão ter que dividir o lucro com os modelos, o que eu acho mais que justo.”

Bauer Rodrigues, que já foi o principal fotógrafo daquela mesma G Magazine que abria a carteira para qualquer corpinho sarado que aparecesse no BBB, representa a indústria erótica tradicional. Ele vê a ascensão do OnlyFans com maus olhos.

“Eu tinha vários clientes de conteúdo erótico. Todos sucumbiram. Todos faliram. Ninguém mais procura meu trabalho. Por isso que fui tentar uma dessas plataformas, mas também não deu certo. Hoje em dia só querem o amador”, diz.

Faz cerca de um ano que Bauer encerrou a conta com 13 assinantes que mantinha no OnlyFans. As fotos em estúdio, com corpos masculinos lustrosos besuntados em óleo, não atraíam fãs e, quando o faziam, acabavam vazadas na internet, numa espécie de “máfia dos prints”.

Este é um problema que todos os produtores de conteúdo adulto enfrentam. As plataformas dizem prestar suporte para combater a prática, e muitos têm equipes de advogados próprios que localizam e derrubam o conteúdo pirateado. Mas é impossível construir uma barreira intransponível.

Nesta “uberização”, em que cada um é em tese dono do próprio negócio, riscos do passado foram herdados e outros surgiram. Cada um lida com eles como pode. Na ala sanitária, indispensável numa indústria em que saliva e outros fluidos corporais são trocados em horário de trabalho, essa autonomia também pode gerar problemas.

Se as grandes produtoras têm protocolos de higiene e saúde para evitar a transmissão de infecções, no OnlyFans e no Privacy cada criador de conteúdo estabelece as próprias regras quando grava cenas com parceiros -que normalmente também são usuários das plataformas ou anônimos encontrados em aplicativos de pegação.

Não que antes a falta de camisinha não tenha causado surtos de infecções em produtoras, mas este é um problema que acabou agravado numa era em que assinantes pedem por uma alta rotatividade de parceiros e em que o sexo caseiro impera.

“Os estúdios não querem problemas, então testam seus modelos, que têm contratos fixos. De vez em quando ainda dá problema. Na indústria amadora, cada um faz o seu controle. O segredo é se testar com frequência. Mesmo assim, me sinto mais seguro trabalhando com os estúdios”, diz Diego Sans.

Mas a transformação parece irreversível, tanto no modelo de negócio quanto na estética da pornografia. De Thomaz Costa, novo no ramo, a Diego, que levou o Brasil para as telas de muito computador mundo afora, todos deixam claro que o amadorismo das imagens do OnlyFans e do Privacy é um potencializador de tesão que não deve sumir dos históricos de navegação tão cedo.

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